Trata-se de embargos de declaração opostos
pelo INSTITUTO AMBIENTAL DO PARANÁ - IAP, por GERAÇÃO CÉU AZUL S/A e
pela UNIÃO contra acórdão desta Turma, proferido em agravo de
instrumento interposto nos autos de ação civil pública, que tem por
objeto a suspensão dos efeitos de licença de instalação da usina
hidrelétrica de Baixo Iguaçu, no Paraná, expedida pelo IAP, que permitiu
o início da edificação do empreendimento. O acórdão embargado foi assim
ementado:
DIREITO AMBIENTAL.
LICENCIAMENTO AMBIENTAL. EMPREENDIMENTO A SER CONSTRUÍDO EM ZONA DE
AMORTECIMENTO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL. USINA HIDRELÉTRICA DE
BAIXO IGUAÇU. PARQUE NACIONAL DO IGUAÇU. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO
ICMBIO.
1. O licenciamento ambiental de
empreendimento que produza impacto ambiental sobre unidade de
conservação e/ou a respectiva zona de amortecimento, além do atendimento
às normas protetivas do ambiente natural em geral, depende da anuência
do órgão responsável pela administração da unidade conservacionista,
conforme previsto no art. 36- § 3º da Lei 9.985/2000.
2.
A anuência do órgão gestor tem de ser obtida em relação ao
empreendimento como um todo, de forma que se tenha certeza quanto à sua
viabilidade ambiental, dada sua influência sobre área especialmente
protegida, e quanto a terem sido realizados todos os estudos necessários
e tomadas todas as medidas possíveis para a minimização do impacto
sobre a unidade de conservação.
3. A
anuência do órgão gestor à concessão de licença prévia para o
empreendimento, mas com o estabelecimento de condicionantes consistentes
na realização de estudos e em medidas complementares necessárias à
proteção da unidade de conservação, obriga o empreendedor a demonstrar
àquele órgão os resultados obtidos com as providências indicadas na
licença prévia, de forma a obter a anuência para a expedição da licença
de instalação da obra. Somente o órgão gestor da unidade
conservacionista, que é quem por ela 'fala', pode avaliar se os
resultados são satisfatórios para a preservação da unidade.
4.
Por isso, por infringência à regra do art. 36- § 3º da Lei 9.985/2000, é
ilegal a expedição de licença de instalação do empreendimento
impactante pelo órgão ambiental estadual competente, sem a prévia
manifestação favorável do órgão gestor da unidade de conservação
atingida, ainda que este tenha anteriormente prestado sua anuência, sob
condição, à expedição de licença prévia.
5.
Agravo de instrumento parcialmente provido para suspender os efeitos da
licença de instalação da usina hidrelétrica de Baixo Iguaçu/PR emitida
pelo Instituto Ambiental do Paraná - IAP, em decorrência da ausência de
prévia manifestação expressa do ICMBio, órgão administrador do Parque
Nacional do Iguaçu, sobre o atendimento das exigências contidas nas
condicionantes previstas na licença prévia do empreendimento, tendentes à
preservação do parque nacional.
As
alegações dos embargantes e as contrarrazões apresentadas estão
relatadas de forma minudente e precisa no notável parecer ofertado neste
TRF pela ilustre Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo,
a quem peço vênia pra transcrever e incorporar a este relatório
excertos da mencionada peça (evento 79):
Nos
seus embargos de declaração (Evento 50), o IAP argui a nulidade do
acórdão do Evento 35 por ter utilizado como fundamento o Ofício nº
238/2014 do ICMBio, juntado de forma inédita em sede de contrarrazões
(Evento 16), não tendo sido oportunizado o contraditório e a ampla
defesa às partes, em ofensa aos arts. 398 do CPC e 5º, LV, da CF.
Acrescenta que o acórdão embargado foi omisso por não tratar da
Resolução CONAMA 237/97, da Instrução Normativa ICMBio 05/2009 e da
Resolução CONAMA 428/2010, que regulamentam o art. 36, § 3º, da Lei nº
9.985/2000 no sentido de que a autorização do órgão gestor de unidades
de conservação, no licenciamento de empreendimentos que as afetem, deve
ser dada em uma única ocasião, que seria antes da Licença Prévia, e não
em todas as etapas do licenciamento. Aduz, ainda, que o acórdão
desconsiderou o art. 13, § 1º, da LC 140/2011, segundo o qual a
manifestação do ICMBio, como órgão interveniente do licenciamento levado
a cabo pelo IAP, não seria vinculante. O IAP alega também que o acórdão
embargado desconsiderou a presunção de legitimidade da Licença de
Instalação nº 17033 e que foi omisso quanto à ofensa à separação de
poderes ao deliberar sobre aspectos intrínsecos do licenciamento
ambiental. Por fim, ressalta que a manifestação do ICMBio e o trecho do
voto-condutor do acórdão que referem o agravamento das alterações de
fluxo do Rio Iguaçu laboram em equívoco e reforçam os argumentos em que
se louva o IAP em seus aclaratórios.
A
seu turno, a Geração Céu Azul S/A opôs embargos de declaração (Evento
51-EMBDECL19), aduzindo, de início, a nulidade do acórdão embargado, em
virtude de não ter sido oportunizada a manifestação das partes acerca do
documento juntado pelo ICMBio no Evento 16, em ofensa ao art. 398 do
CPC e 5º, LV, da CF. Acaso não reconhecida essa nulidade, aponta a
empresa a existência de 5 (cinco) omissões no acórdão embargado, as
quais pede sejam supridas, bem como prequestionados os dispositivos
legais e constitucionais a elas pertinentes. A primeira omissão diz
respeito à alegada unicidade da autorização dada pelo ICMBio, antes da
licença-prévia, conforme a Resolução CONAMA 428/2010, a IN ICMBio nº
05/2009 e Portaria MMA 05/2014, todas regulamentadoras do art. 36, § 3º,
da Lei nº 9.985/2000, em argumentação semelhante à desenvolvida pelo
IAP nesse ponto em seus embargos. A segunda omissão é relativa à não
vinculação do órgão licenciador - no caso o IAP - às manifestações dos
órgãos intervenientes no licenciamento, em observância ao art. 13, § 1º,
da Lei Complementar nº 140/2011 e ao princípio da eficiência
administrativa. A terceira omissão é a de não apreciação da presunção de
legitimidade da Licença de Instalação nº 17033, com base no art. 37 da
Constituição. A quarta omissão é referente às questões de variação das
vazões do Rio Iguaçu, as quais foram objeto da Resolução ANA nº
142/2014. Por derradeiro, a quinta omissão diz respeito à ausência de
respeito aos princípios da boa-fé e da segurança jurídica.
Já
a União igualmente apresentou embargos de declaração (Evento
53-EMBDECL1). Neles, aduz que o acórdão embargado apresenta três
obscuridades: (1ª) os termos do tópico nº 3 do voto-condutor do acórdão
remetem a afirmações que teriam restado superadas no julgamento dos
Embargos Infringentes em AC nº 5000970-08.2011.404.7007. Disso resulta
que seria necessário aclarar o acórdão quanto à base legal para exigir
anuência específica do ICMBio para a expedição da licença de instalação,
a qual não poderia ser extraída do art. 36, § 3º, da Lei nº 9.985/2000;
(2ª) por ocasião da autorização dada pelo ICMBio para a Licença Prévia e
que foi objeto do julgamento dos embargos infringentes referidos no
item anterior, foram apresentadas condicionantes que não seriam
pressupostos para as licenças seguintes (de Instalação e de Operação),
mas sim providências a serem observadas durante o transcurso de cada
fase do empreendimento. Como o acórdão embargado entendeu descumpridas
algumas dessas condicionantes e isso não teria sido arguido nos autos
originários e nem no presente agravo, os elementos assentados no citado
julgamento dos embargos infringentes estariam sendo valorados de forma
inversa, gerando obscuridade; (3ª) em momento algum do presente agravo e
dos autos originários estaria o ICMBio infirmando a validade da licença
de instalação do empreendimento, mas apenas pretendendo indicar medidas
mitigadoras do impacto ambiental decorrente da instalação da UHE Baixo
Iguaçu, estando o ICMBio em oposição ao que pretendem os agravantes.
Conclui daí que não pode o Judiciário suprir o silêncio da autarquia. A
União aponta, ainda, duas omissões do acórdão embargado: (1ª) ausência
de observância ao princípio da confiança, subprincípio da segurança
jurídica, que tem respaldo nos arts. 2º da lei nº 9.784/99 e 36, § 3º,
da Lei nº 9.985/2000, dos quais pede o prequestionamento; (2ª) ausência
de manifestação expressa sobre a alegação de perda superveniente de
objeto do agravo e sobre o preenchimento dos requisitos do art. 273 do
CPC para a concessão da antecipação da tutela recursal no caso.
Após
a oposição dos embargos, o Relator abriu a possibilidade de
apresentação de contrarrazões, tendo em vista o caráter infringente dos
pedidos neles veiculados, e também de contradita às petições e
documentos juntados (Evento 54).
O
ICMBio apresentou suas contrarrazões no Evento 73. Começa ressaltando
que não há autorização válida do ICMBio para o empreendimento UHE Baixo
Iguaçu, pois a que fora concedida antes da Licença Prévia veio a ser
cassada em 23/10/2008. Essa cassação foi discutida judicialmente, sendo
considerada válida pelo E. TRF4, mas com efeito ex tunc, não podendo
retroagir de modo a tornar nula a licença prévia expedida com base nela.
Acrescenta que o Instituto vem manifestando, nos autos e
administrativamente junto ao IAP, sua clara discordância quanto aos
termos da licença de instalação e que o quadro de incertezas do
Instituto quanto à viabilidade do empreendimento voltou a crescer diante
dos acontecimentos climáticos do mês de junho (cheia do Rio Iguaçu).
Sobre a alegação de nulidade do acórdão por não ter sido oportunizado às
partes se manifestarem acerca do documento juntado no Evento 16, aduz
que tanto o IAP quanto o empreendedor já tinham recebido diretamente, na
seara administrativa, o Ofício em questão, juntado aos autos depois, no
citado Evento 16, e sobre ele não se manifestaram. Também aponta que
não houve prejuízo com essa juntada, o que é pressuposto para declarar
eventual nulidade. Em seguida, afirma que as exigências complementares
que fez não foram ainda atendidas, nada lhe tendo sido comunicado
oficialmente, e que as reuniões de que tem participado junto ao IAP não
significam concordância com a Licença de Instalação, mas demonstram a
preocupação do Instituto em rever a viabilidade do empreendimento tal
como vem sendo executado. O ICMBio defende ainda que sua anuência é
vinculante, nos termos do art. 36, § 3º, da Lei nº 9.985/2000 e do art.
1º, § 2º, da Resolução CONAMA 428/2010, até porque a citada lei e a
invocada Lei Complementar nº 140/2011 regulamentam distintos
dispositivos constitucionais, ressaltando que a Lei nº 9.985/2000 é lei
especial e não é derrogada por lei geral, como a LC 140/2011. O
Instituto também aduz que o empreendedor, ciente da discussão judicial
anterior acerca da validade da licença prévia em virtude da cassação da
autorização do ICMBio, não pode alegar boa-fé e nem dizer que o
princípio da segurança jurídica foi desrespeitado. Por fim, o Instituto
alega que, mesmo que se admitisse que a sua anuência é um ato único e
anterior à Licença Prévia, isso não significa que ele esteja impedido de
participar das demais etapas do licenciamento ambiental, mormente
porque ficaram pendentes de atendimento condicionantes impostas na
anuência.
No Evento 74, a Geração
Céu Azul S/A manifestou-se sobre os Eventos 16, 24, 25 e 32, anexando
outros 16 (dezesseis) documentos. Nessa oportunidade, reiterou que o
ICMBio já teve sua participação perfeita e suficiente no licenciamento
ambiental do empreendimento em questão, não se devendo cogitar de nova
oportunidade de manifestação formal do citado instituto para a concessão
da Licença de Instalação. Acrescentou o empreendedor que o projeto
objeto de análise pela UNESCO quanto à UHE Baixo Iguaçu foi o primeiro
apresentado, e não a versão que se encontra em execução, devidamente
alterada. Quanto à questão dos ribeirinhos, a Geração Céu Azul afirma
carecerem de respaldo as afirmações de que se nega a negociar com os
atingidos, pois já participou de mais de 28 reuniões sobre o assunto,
bem como que a Resolução Conjunta SEMA/IAP 09/2010 é expressa em exigir,
de modo alternativo, a anuência dos proprietários atingidos ou o
decreto de utilidade pública. Por fim, ressalta que as obras de
construção da usina não tiveram qualquer relação com as enchentes que
ocorreram na região - fruto de evento meteorológico - e que não possui
respaldo a assertiva de que a empresa não estaria agindo suficientemente
para avaliar os impactos negativos do empreendimento sobre a espécie
Surubim do Iguaçu.
Já a União se
manifestou (Evento 75) ratificando as alegações que apresentara nos seus
embargos de declaração, que considerou referendadas pelas alegações do
IAP e da Geração Azul nos seus embargos e pelos documentos apresentados
pelo próprio ICMBio.
O Ministério Público Federal, neste Tribunal, opinou pelo desprovimento dos embargos de declaração (evento 79).
É o relatório.
Trago os autos em mesa.
Fonte TRF4 - Porto Alegre
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